segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Para um Ensino Superior Relevante e Sustentável - Resumo

Resumo


José Ferreira Gomes[1]
Faculdade de Ciências, Universidade do Porto



Resumo:
O acesso ao ensino superior é a aspiração de um número crescente de jovens em muitas regiões do mundo, sendo já concretizado, em alguns países, por mais de 50% da população jovem. Nos países mais ricos, o crescimento do acesso deu-se, gradualmente, na segunda metade do século XX. No virar do milénio a expansão do acesso tornou-se uma preocupação política em quase todas as regiões do mundo e uma forte aspiração da generalidade dos jovens crescendo em ambiente urbano. Esta realidade criou enormes tensões no financiamento, mas também na qualidade do serviço educativo prestado e na sua relevância para a sociedade. O esforço político de reforma dos sistemas de ensino superior tem sido uma preocupação permanente na generalidade dos países, sendo os temas dominantes (1) a qualidade académica do ensino, (2) a relevância social dos cursos propostos, (3) a empregabilidade dos diplomados e (4) o financiamento das instituições. O problema social do desemprego e do subemprego de diplomados é uma nova realidade nas preocupações políticas de muitos governos em todos os continentes.
Com a massificação do acesso ao ensino superior, tornou-se necessário diversificar a oferta. Enquanto que, tradicionalmente, os diplomados do ensino superior se destinavam à burocracia do estado e a algumas poucas profissões liberais, eles dirigem-se hoje prioritariamente para o setor privado e para funções muito diversas. As instituições de ensino superior têm tido dificuldade em responder a esta nova realidade. Os estudantes e as famílias parece tomarem as suas opções no antigo quadro de organização social, criando expectativas impossíveis de realizar. Esta uma das causas possíveis para os problemas sociais conhecidos em países com histórias de ensino superior muito diferentes. Os governos têm procurado incentivar uma maior diversificação através da diferenciação institucional entre universidades e politécnicos. A perceção social desta nova realidade é um processo muito lento, mas há iniciativas de reforço em resposta às necessidades sociais reconhecidas. Atualmente, podemos identificar pelo menos três tipos de percurso inicial no ensino superior em muitos países onde este percurso foi iniciado mais cedo. (1) Cursos curtos de 2 anos de cariz muito profissional e de perfil estreito com vista à entrada imediata no mercado de trabalho. (2) Cursos tipicamente de 3 anos (licenciatura) com ênfase na vertente profissional com uma boa base teórica, mas focada no objetivo definido; a continuação de estudos é possível, mas quase sempre exige um esforço adicional de reforço das bases concetuais. (3) Cursos de 3 anos (licenciatura) desenhados para a continuação de estudos em mestrado (2 anos), embora se procure criar condições para a alternativa de entrada imediata no mercado de trabalho deixando ao estudante o esforço de adaptação ao posto de trabalho por que venha a optar. O mestrado é visto como um aprofundamento e aplicação dos conhecimentos adquiridos para o domínio de uma área de conhecimento e para o exercício profissional autónomo nas áreas tecnicamente mais avançadas. Outros mestrados podem ter o papel de especialização ou de reorientação profissional de ativos. Muitos países e muitas instituições de ensino superior insistem de forma crescente na interação do estudante com alguma atividade profissional (estágios) para facilitar a transição e ajudar o estudante a fazer a sua escolha de percurso educativo.
Tradicionalmente, as instituições de ensino superior desenvolveram-se na forma de universidades públicas ou privadas sem fins de lucro e esta é ainda a realidade dominante na Europa Ocidental e na América do Norte. Nos anos mais recentes, a iniciativa empresarial tem um papel crescente em muitos países, o que colocou problemas novos à regulação pública da educação superior. A dificuldade resulta da grande imperfeição do mercado educativo por o “cliente” não ser capaz de avaliar a qualidade do serviço que vai comprar; na melhor das hipóteses, poderá avaliar esta qualidade décadas depois de completado o processo educativo. Embora sejam reconhecidas as externalidades positivas, o acesso ao ensino superior tem benefícios pessoais muito significativos que justificam a participação dos jovens e das famílias no seu financiamento. Apesar de ainda haver alguns países europeus com ensino superior gratuito (sem propinas), a partilha dos custos com participação crescente das famílias é hoje a norma. Nos países em desenvolvimento, o retorno privado da educação superior é, em regra, muito elevado e o custo de um curso tende a ser muito alto quando expresso em unidades de PIB per capita. Esta realidade cria problemas mais severos ao financiamento público e justifica a maior participação das famílias. A exigência de participação das famílias no financiamento, exige sempre algum sistema de apoio público aquelas que não têm condições económicas para o fazer. Só assim é possível assegurar a equidade no acesso e se pode esperar o aproveitamento pleno do potencial intelectual dos jovens para participarem no desenvolvimento social e económico. Estes sistemas de apoio representam um esforço financeiro significativo por terem de apoiar mais de 25% dos estudantes e não ser fácil estabelecer e aplicar critérios justos para a definição do estado de carência. A alternativa de transferir o custo da educação para o estudante através de um empréstimo a pagar no futuro foi defendida por alguns peritos e está em aplicação em alguns países, mas têm surgido problemas graves de sustentabilidade, mesmo em países como a Inglaterra.



[1] Apresentado na Conferência sobre o Financiamento do Ensino Superior, 1-2 de setembro de 2016, Centro de Conferências de Belas, Luanda, promovida pelo Ministério do Ensino Superior e pela Fundação Sagrada Esperança.

Sem comentários:

Enviar um comentário