Foi-me pedido para descrever como foi possível montar uma estratégia de motivação da universidade para lançar uma iniciativa de acolhimento de alunos do básico e secundário que, logo no primeiro ano (2006), teve mais de 4000 jovens ocupados pelo menos uma semana de 40 horas durante o mês de Julho. O sucesso desta Universidade Júnior (https://universidadejunior.up.pt/) depende da adesão voluntária de centenas de docentes sem qualquer remuneração adicional.
A universidade é uma organização de peritos onde, naturalmente, cada docente/investigador persegue os seus interesses pessoais. Tradicionalmente, havia alguma disciplina na função de ensino que tinha de ser coordenada entre todos os docentes, mas uma total liberdade na definição dos objetivos individuais de investigação e na reunião dos meios necessários ao sucesso do percurso escolhido. Nos últimos decénios, a sociedade vem solicitando a universidade para a satisfação de necessidades sociais cada vez mais complexas e mantém-se em aberto a definição do melhor modelo organizacional para atingir objetivos tão diversos e até contraditórios. É bem conhecida a resistência dos docentes/investigadores a responderem a solicitações dos órgãos de direção porque sentem maior estímulo para alinharem a sua estratégia com os valores da sua disciplina do que com os que são assumidos como estratégicos para a instituição. À falta de meios para assegurar que uma estratégia definida centralmente é aceite e assumida por toda a instituição, a liderança vê-se obrigada a identificar as grandes linhas de evolução do universo dos seus docentes/investigadores e assumir como suas essas tendências.
A autonomia que a
generalidade dos estados concedeu às universidades na segunda metade do século
XX é, apesar da roupagem que pode assumir nos diferentes contextos sociais e políticos
nacionais, uma autonomia funcional. Tem por único objetivo a melhor prossecução
dos objetivos nacionais, reconhecendo o Estado que a gestão burocrática se tornou
demasiado ineficaz. Analogamente, a autonomia de que cada agente beneficia
internamente na sua relação com a organização tem de ser também entendida como
uma autonomia funcional que produzirá melhores resultados do que uma impossível
microgestão das múltiplas funções solicitadas a cada membro.
A orientação
estratégica efetiva da universidade é feita por estímulos. O mais importante é
o mecanismo de financiamento, estando as organizações universitárias muito bem
treinadas na construção de respostas que maximizem o seu benefício. Na maioria
dos casos, estes estímulos financeiros não têm reflexo num prémio salarial mas
apenas nos meios humanos e materiais que permitem mais atividade e maior
reconhecimento nacional e internacional dessa atividade.
Foi-me pedido para
descrever como foi possível montar uma estratégia de motivação da universidade
para lançar uma iniciativa de acolhimento de alunos do básico e secundário que,
logo no primeiro ano (2006), teve mais de 4000 jovens ocupados pelo menos uma semana de 40
horas. O sucesso desta Universidade Júnior (https://universidadejunior.up.pt/) depende da adesão voluntária de centenas de docentes sem qualquer remuneração
adicional. Algumas centenas de monitores são recrutados e treinados para
acompanhar os jovens durante as suas 40 horas de permanência na universidade.
As atividades oferecidas têm a componente lúdica necessária à motivação de jovens
adolescentes em férias (Julho), sem desvalorizar uma prática escolar que é vista
pelos docentes universitários como de motivação dos jovens para optarem pela sua
área do conhecimento. As famílias têm de ver na experiência dos seus filhos um
valor acrescentado que justifique o esforço logístico e financeiro (inscrição
de 50€ para uma semana de atividades, no primeiro ano). Aos municípios próximos
do Porto, foi proposta uma parceria em que eles apoiariam a participação de
alguns dos seus jovens e, em muitos casos, responsabilizar-se-iam pelas
deslocações pendulares diárias. Para os jovens de mais longe, foi criado um
programa residencial complementar que é ativado entre as 17 horas de um dia e
as 9 horas do dia seguinte com atividades lúdicas, refeição e dormida. Conseguiu-se
o apoio do Exército que, como retorno, apenas pode esperar uma imagem positiva junto das
centenas de participantes.
O sucesso da iniciativa que se mantém com ligeiras afinações por mais de 10 anos depende da motivação (não financeira) de vários parceiros que vêm de alguma forma satisfeito um interesse próprio. A dimensão do programa não poderia ser menor porque teria de ser comparável com o número de novos estudantes que anualmente são admitidos na Universidade do Porto. Para satisfazer as várias fases etárias, desde os 11 aos 17 anos, foram criados programas diferentes, todos ocupando as 40 horas semanais, mas exigindo tempos de atenção muito diferentes. Para os mais jovens, todos os dias há atividades novas decorrendo em ambiente diferente e até em locais diferentes da cidade. Os mais velhos têm já um objetivo mais exigente, um projeto que vão desenvolver ao longo de toda a semana.
Também se procurou
satisfazer o diferente grau de motivação dos jovens, oferecendo escolas (normalmente de 2 semanas) com a
natureza e a ambição de uma verdadeira Escola de Verão com aulas
teóricas e práticas e o desenvolvimento de um pequeno projeto a ser defendido no
último dia. Uma oferta diversificada consegue servir os interesses e as idades
dos jovens com experiências pessoais diferentes. Os docentes assumem a
coordenação de um programa de atividades e a formação de um monitor que põe todo
o empenho e a disponibilidade para, frequentemente, a sua primeira experiência
de “trabalho”. Os jovens encontram um espaço de aprendizagem em ambiente lúdico
e o convívio com novos colegas em pequenas turmas de cerca de 14 alunos para 2
monitores. Este rácio permite o apoio individual nas atividades e o acompanhamento
pessoal próximo que evita o risco de acidentes. Uma pequeníssima equipa
profissional de montagem de todo o programa ao longo de vários meses e o apoio
jovem no programa de alojamento são também a chave do sucesso.
A Universidade Júnior – O sucesso pela motivação dos parceiros
José Ferreira Gomes, http://www.fc.up.pt/pessoas/jfgomes/
Apresentado na VII Jornadas Empresariais das Fundações AEP e Serralves, 20 de outubro de 2016, Auditório de Serralves, “Iniciativa e Realização”
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