Foi agora promulgada com data de 7 de julho a alteração ao decreto lei 57/2016 de 29 de agosto relativo à contratação de bolseiros. Valha-nos que a aprovação na Assembleia da república (no dia 24 de maio passado) não teve a unanimidade dos deputados (abstenção do PSD e CDS). Mesmo assim, o Presidente da República parece ter compreendido o mau serviço que se está a prestar ao país. Que outro sentido poderá ter o comentário publicado:
Apesar de poder envolver um acréscimo de custos para as instituições académicas públicas nos próximos anos – que o Estado dificilmente não terá de assumir como despesa sua –, de poder implicar eventuais questões com docentes já em funções, de criar problemas de gestão de contratações futuras para a investigação e a docência e de apresentar pontos insuficientemente desenvolvidos – como o da progressão nas carreiras –, atendendo a que o presente diploma visa reparar uma flagrante situação de injustiça – qual seja a da precariedade de muitos bolseiros doutorados que desempenham funções em instituições públicas, que deveriam corresponder a um estatuto contratual estável – e de que se trata de um regime excecional e portanto irrepetível, o Presidente da República promulgou o diploma da Assembleia da República que procede à primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, que aprova um regime de contratação de doutorados destinado a estimular o emprego científico e tecnológico em todas as áreas de conhecimento.
Relembro a história de uma aprovação por unanimidade...
E a Ordem dos Engenheiros Técnicos nasceu na sessão final
Este é um caso paradigmático do funcionamento do
Parlamento nos últimos dias de uma legislatura. Vale a pena explicar a sessão final do plenário, em 6 de Abril, um dos muitos
diplomas sujeitos a aprovação foi o que cria a nova “Ordem dos Engenheiros Técnicos”
e aprova os respectivos estatutos. Foi aprovado com o voto favorável dos seis grupos
parlamentares. Uma medida pacífica, portanto. Contudo, minutos antes da votação
havia acordo das mesmas seis bancadas para que o diploma fosse retirado do guião
de votações e assim caísse no esquecimento sem votação. Como é possível que, à
distância de alguns minutos, se possa obter a unanimidade parlamentar num
sentido e, depois, em sentido contrário? Um caso paradigmático do funcionamento
do Parlamento nos últimos dias de uma legislatura. Vale a pena explicar.
A proposta de criação da Ordem dos Engenheiros Técnicos
surgiu pela mão do grupo parlamentar do PS disfarçada de simples alteração
estatutária da associação profissional ANET e assim conseguiu a aprovação na generalidade
com votação por unanimidade. Seguiu a sua tramitação discreta até que começaram
a surgir os alertas para a falta de definição do Acto de Engenharia Técnica por
a sua descrição coincidir com a já existente para o Acto de Engenharia tutelado
pela Ordem dos Engenheiros. Depois seguem-se os quase compromissos usuais dos vários
grupos parlamentares com os vários interesses em presença, mas a expectativa
generalizada é que o assunto nunca chegaria a plenário, evitando-se assim o embaraço
de inverter uma votação já feita na generalidade. Não aconteceria assim porque
os mesmos interesses que haviam levado o PS a assumir a proposta também
garantiram agora a sua inserção no guião para as votações do último dia da
legislatura, entre as muitas promoções de aldeia a vila e de vila a cidade em
que estes dias são férteis. Já em plena tarde de votações começaram as
movimentações de backbenchers que se
sentiram ludibriados na sua expectativa ou mesmo promessa explícita de que o
resultado seria diferente. A primeira movimentação surgiu da bancada do PS e
facilmente contagiou as outras bancadas, até ao ponto de haver acordo unânime
para que a proposta de criação da nova Ordem fosse retirada do guião de
votações. Nestes contactos entre os coordenadores que tinham acompanhado esta
proposta em cada grupo parlamentar não surgiu um único deputado que defendesse
os méritos da proposta, embora alguns tivessem dificuldade em dar o primeiro
passo. Chegou-se ao acordo unânime de que ninguém levantaria objecções à
iniciativa que teria de vir do proponente de retirar a proposta de votação.
Como do lado da bancada do PS ninguém defendia outra solução, o problema estava
resolvido e a regulação das profissões de engenharia ficaria
reservada para outro espaço e outro tempo. Assim estivemos uma boa hora, até
que chegou a notícia de que a direcção da bancada do PS já não estaria disponível
para requerer a alteração do guião de votações. Pelo fim
da tarde lá ouvimos um Jaime Gama em dia de despedida parlamentar a chamar os
senhores deputados a votar a criação da Ordem dos Engenheiros Técnicos e a
proposta lá seguiu com o acordo dos seis grupos parlamentares, ainda que muitos
deputados tenham expressado o seu desacordo através do voto dissonante e da
declaração de voto.
Terá sido a última vitória de Sócrates numa tarde
em que já dera sinal de que o FMI estava chamado a intervir. Vitória de Sócrates
porque tudo indica que a decisão não terá resultado da vontade dos deputados,
nenhum de nenhuma bancada deu a cara (em privado) pela solução que todos
aprovaram! Mas o Parlamento é mais do que a vontade dos deputados e os partidos
extraparlamentares e os seus mais bem colocados assessores têm mais força.
José Ferreira Gomes
Deputado na XI legislatura, PSD, Bragança
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