Temos celebrado
bem o sucesso do desenvolvimento científico conseguido nos últimos anos (https://www.publico.pt/2017/04/05/ciencia/noticia/portugal-quase-no-top-ten-da-ciencia-europeia-1767644). Muitos
passaram da certeza do naufrágio à euforia do sucesso num fechar e abrir de
olhos. A verdade é que a Ciência foi protegida da correção orçamental e que se
manteve o crescimento da produção científica ao longo dos anos de correção
orçamental. Uso os dados Scimago, http://www.scimagojr.com/countryrank.php?region=Western%20Europe
e faço a correção ao número de documentos para o equivalente em 2010
para corrigir a inflação da base de revistas consideradas e alguma subida do
número de publicações por autor e por ano em todo o mundo.
Neste indicador
muito significativo, Portugal ultrapassou sucessivamente a Itália, a Grécia e,
para enorme alegria e surpresa de muitos, a França e a Alemanha. Mesmo em
relação ao Reino Unido, passamos de 21% para 84% nos últimos 20 anos. Portugal
manteve o crescimento, enquanto a Irlanda e a Espanha tinham quebras visíveis a
partir de 2011 e 2012.
Os indicadores
de produção científica são muito importantes, mas o objetivo de uma política
nacional de ciência tem de ser outro e talvez se encontre aqui a explicação
para a surpresa do declínio aparente de alguns países. A assunção do retorno
económico do investimento em ciência como objetivo último da política
científica poderá ser ainda controverso. É certamente mais difícil de medir e
mais difícil de atingir.
No entretanto,
todos concordarão que o objetivo não pode ser a produção de artigos que ninguém
lê. Por isso, as métricas de avaliação são hoje mais orientadas para o número
de citações do que para o número de artigos. Não interessará comentar aqueles
que fogem ao uso de qualquer métrica e pretendem orientar uma política nacional
de ciência pelas impressões subjetivas de alguém, ainda que muito bem
informado! A generalidade dos países baseia as suas políticas na evidência do
impacto e a contagem das citações em geral ou das citações nas patentes submetidas são os
indicadores mais comuns do êxito. Para Portugal, uma métrica da citação em
patentes é ainda impossível pela incipiência do registo de patentes e pela
quase inexistência de patentes portuguesas em exploração. Já a contagem geral
de citações pode ser feita e dá uma medida do impacto que a ciência portuguesa
já conseguiu na comunidade mundial. Infelizmente as notícias não são muito
boas. Portugal não conseguiu sair do último lugar europeu e até parece cada vez
mais isolado nessa zona de desconforto. Infelizmente, estamos muito longe do top ten da ciência europeia!
Será compreensível que uma comunidade relativamente
jovem tenha alguma dificuldade em afirmar-se. Não deixa de ser preocupante que
não pareça estar a atenuar a sua fragilidade. Mais grave é que as políticas de
ciência não a queiram ver e se disponham a seguir um caminho que
poderá agravar esta realidade.
Só muito recentemente, estava a aumentar o número
de doutorados fora do sistema académico. Não é um processo fácil, mas só esses
pioneiros poderão abrir a porta à colaboração da investigação académica com as
empresas e outras organizações interessadas na inovação. Nos países que
procuramos seguir, a maioria dos doutorados preferem uma carreira fora do
sistema público de investigação por terem aí melhores expectativas de sucesso
profissional apesar dos constrangimentos a que estarão sujeitos para atingir
resultados sintonizados com os caprichos do mercado. Já aqui foi dito que a situação
atual de muitos jovens investigadores é insustentável (http://maissuperior.blogspot.pt/2017/02/precarios-da-ciencia.html).
Sabemos que o nosso tecido empresarial é frágil e que as PME tradicionais não
têm capacidade para contratar doutorados, mas muitos começavam a encontrar o
seu caminho e iriam contribuir para a desejada transformação do tecido
produtivo. E iriam abrir o caminho para a contratação de muitos outros
doutorados. A oferta de lugares à medida dos atuais pós-doc é indigno e vai diminuir
o contributo que poderiam dar para o desenvolvimento do país. O nosso sistema
de ensino superior precisa certamente de ser renovado regularmente, mas tem de
ter condições para escolher os melhores. Para melhorarmos os indicadores e para
que esses indicadores se reflitam num reforçado contributo para a riqueza de
todos os portugueses, temos de melhorar a transparência do sistema de
recrutamento e de avaliação.
O apoio ao desenvolvimento da economia será feito
por instituições de investigação e de inovação bem focadas nas necessidades
reais do país, tal qual ele é. O ensino superior já deu provas de que pode apoiar esse processo,
mas não é dentro dos seus laboratórios e dentro da sua cultura académica que se
vai dar essa transformação. Falhou em Portugal e falhou no resto da Europa. Não
podemos distrair a competência jovem que criámos nos últimos anos para
objetivos diferentes. Segundo as estatísticas oficiais, nos últimos anos a
despesa empresarial em I&D caiu. Isto pode dever-se à forma de recolha dos
dados já que havia resultados surpreendentes. Mas todos sabemos do percurso
difícil das maiores empresas no ranking de despesa I&D. Temos os meios para
recomeçar este caminho difícil de abertura da nossa comunidade científica às necessidades
do nosso desenvolvimento. Não é seguro que queiramos. Ou talvez não saibamos
como fazê-lo e seja mais fácil alimentar alguns grupos de pressão sempre
disponíveis para aplaudir uma “boa política”.
Sem comentários:
Enviar um comentário