Para universidades e
politécnicos, já sabemos que haverá uma redução efetiva porque nem toda a
despesa adicional gerada pelo governo virá a ser paga em dotação de orçamento
de estado. Na Ciência já não se consegue esconder o descalabro. Cativações
(reais) crescentes nos últimos anos tiram credibilidade à dotação que nos é
agora apresentada para 2019 na FCT. O plano é duplicar o custo do ensino
superior (com pessoal de investigação) sem curar de melhorar o ensino nem o
impacto desta despesa na economia portuguesa? Tenho de votar contra o OE2019!
Porque votaria contra um orçamento que, segundo consta,
dá tudo a todos. Não haverá grupo de interesses que não tenha sido atendido. O
ensino superior não foi! Precisará de algum dinheiro, mas não é com dinheiro
que se melhora o nosso serviço de educação, nem o básico e secundário nem o
superior. Ao superior, este governo não quis oferecer dinheiro e também não
criou o enquadramento necessário para a melhoria.
As dotações para as instituições de ensino
superior do estado sofreram cortes sucessivos desde o princípio deste século.
Nuns anos porque a pressão orçamental era fortíssima e não poderiam ser
exceção; noutros porque os governos entenderam que o retorno político das
dotações para a ciência é melhor do que o das que são encaminhadas para as
universidades e os institutos politécnicos. Retrospetivamente, teremos de
concordar que as dotações eram folgadas no século passado quando havia grande
pressão estudantil para aumentar o número de vagas. A realidade mudou quando a
procura estudantil estabilizou e o crescimento económico estancou. Mas é
incompreensível que a folga temporária de que goza agora este governo não seja
encaminhada para garantir a consolidação da qualidade, das instalações e da
equidade no acesso ao nosso ensino superior. A afirmação do relatório do OE de
que este consagra o reforço da estratégia
em curso para a modernização, qualificação e diversificação do ensino superior é
puramente retórica e, como frequentemente acontece em declarações políticas,
pretende esconder uma realidade oposta. Apesar dos anúncios repetidos, nada foi
feito no sentido declarado e algumas medidas são contrárias à modernização e à
diversificação, tornando ainda mais incompreensíveis as diferenças entre as
ofertas educativas existentes.
Não é possível discutir os eventuais aumentos do
orçamento porque não conhecemos ainda as cativações de 2018 e não podemos
prever o que acontecerá em 2019. Para universidades e politécnicos, já sabemos
que haverá uma redução efetiva porque nem toda a despesa adicional gerada pelo
governo virá a ser paga em dotação de orçamento de estado. Para a FCT, é mais incerto,
mas a realidade tem ficado longe das promessas. Pelos dados publicados pela
FCT, na vigência deste governo a execução ficou sempre aquém da conseguida nos
“anos negros da troica” e muito aquém do orçamentado. Esta má prática tem vindo
a acentuar-se ao longo desta legislatura e não sabemos até onde chegará em
2019, no meio ano depois das eleições. O outro fator que falseia os orçamentos
é o mau hábito de atrasar pagamentos ou de levar despesa diretamente à conta de
dívida pública. Do lado da FCT, nunca é apresentada uma conta de dívida às
instituições e de compromissos plurianuais assumidos com nacionais ou
internacionais. Do lado das universidades e institutos politécnicos, sabemos
que há um número crescente a usar os saldos transitados de anos anteriores, antes
de serem autorizados a recorrer ao fundo criado pela cativação efetiva de 0,25%
sobre a dotação de todas as instituições de ensino superior.
Não sendo possível analisar a situação real de
cada árvore, é contudo possível ver a floresta e os enormes desafios que
enfrenta. Portugal tem ainda um bom sistema de ensino superior, mas de
afirmação tardia e ainda pouco diferenciado. A definição de rácios docente:
discente no início da década de 1990 estimulou o rápido crescimento de
universidades e institutos politécnicos para assim responder ao surto da
procura ocorrido na década de 1986-96. Mas este estímulo sobrevive ainda na
mente de todos, passados 20 anos em que outros estímulos à consolidação seriam
mais necessários. Não existem ainda. O financiamento “por fórmula” exigido pela
lei de 2005 nunca foi aplicado e o modelo de financiamento consensualizado em
2015 foi ignorado por este governo. A alternativa preferida é da gestão
quotidiana de um caos sem objetivos nem estímulos à boa gestão. As instituições
mais sólidas são acusadas de terem saldos, mesmo que amealhados a custo para
acudir a necessidades de investimento bem identificadas. As instituições mais
frágeis são estimuladas a esgotar os saldos com a garantia de que o governo
lhes dará proteção desde que se saibam comportar... Com a enorme vantagem
política de que estes défices não aparecem no défice da conta geral do estado
(embora acabem na dívida pública).
O nosso ensino superior não pode manter a sua
qualidade com o efeito conjugado das medidas de aumento dos custos do pessoal e
de aperto nas dotações. As instituições de ensino superior conseguiram
ajustar-se às reduções progressivas dos últimos 20 anos à custa de alguma
redução de pessoal docente, substituído em parte por investigadores pós-doc e
estudantes de doutoramento, seguindo as melhores práticas de universidades de
investigação estrangeiras. E toda a manutenção de edifícios foi adiada.
Infelizmente, também foi reduzido o tempo de contacto, mesmo em situações em
que a fragilidade (e pouca autonomia) dos estudantes não o recomendariam. E
lembremos que vários países foram por este caminho e os resultados foram muito
maus.
Depois de um longo período de emagrecimento, o
financiamento terá de ser reposto com um modelo transparente que exija um bom
ensino, que premeie o melhor desempenho na investigação e na transferência de
conhecimento para benefício do país. Não é isso que promete o OE 2019! Bons e
maus terão o mesmo financiamento e este será aferido por aquilo que recebiam há
20 anos, independentemente do que tenham feito no entretanto. Injusto. Negativo
pelos incentivos perversos que semeia. É
uma oportunidade perdida. Não se aproveitando a pequena margem oferecida pelo
crescimento (ainda que anémico por comparação com os nossos competidores
europeus), corremos o risco de ter de enfrentar um novo período de dificuldades
sem a casa arrumada.
Na Ciência já não se consegue esconder o
descalabro. Cativações (reais) crescentes nos últimos anos tiram credibilidade
à dotação que nos é agora apresentada para 2019 na FCT. Mesmo sem cativações
seria provavelmente insuficiente para todos os lóbis. Para as universidades
americanas entreabrirem as portas a alguns portugueses (que depois podem ficar
por lá...) e os melhores já teriam as portas mais do que abertas. Um Azores International Research Center
para que, surpreendentemente, foram chamar a China ao mais alto nível e com o
máximo impacto político internacional e que agora se reconverte na tentativa de
um “porto espacial” comercial em que o concurso internacional tem o “apoio
técnico”, só este, da Agência Espacial Europeia. Sonhos caros realidades fugidias.
Compromissos de pagamento de 5000 contratos de investigadores... Como este
número corresponde a metade dos doutoramentos terminados na legislatura, outra
onda similar se esperará para uma próxima legislatura. O custo será de 250 M€
anuais agora para duplicar na próxima legislatura e atingir mais de mil milhões
anuais antes de entrar em estado estacionário. É este o plano governamental?
Duplicar o custo do ensino superior (com pessoal de investigação) sem curar de
melhorar o ensino nem o impacto desta despesa na economia portuguesa? Tenho de
votar contra o OE2019!
Publicado em Observador, 26/out/2018
Nota: De acordo com os relatórios de atividades da FCT já publicados, a despesa executada pela FCT tem vindo a diminuir desde 2013, apesar de os orçamentos crescerem.
Publicado em Observador, 26/out/2018
Nota: De acordo com os relatórios de atividades da FCT já publicados, a despesa executada pela FCT tem vindo a diminuir desde 2013, apesar de os orçamentos crescerem.
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