segunda-feira, 19 de junho de 2017

Educação científica e desenvolvimento económico


Resumo
Portugal atrasou-se imenso na criação de um ensino secundário profissionalizante e ainda hoje há deficiências notórias. A participação é baixa e a qualidade talvez se ressinta de não haver padrões nacionais de avaliação e de comparação. Só em 2014 foi criado o ciclo curto de ensino superior, TeSP, Técnico Superior Profissional, que está a crescer a muito bom ritmo, mas ainda sofre do grande atraso histórico.

O programa de austeridade decorrente do pedido de ajuda financeira à Troika levou o desemprego a subir até ao máximo de 16,2% em 2013 para voltar aos 11,1% em 2016. Simultaneamente, o desemprego jovem (menores de 25 anos) subiu até 38,1% e não foi abaixo dos 28% em 2016. Os graduados pelo o ensino superior também foram atingidos, ainda que em menor grau.
Estes resultados merecem alguma reflexão. Em primeiro lugar, o choque de haver algum desemprego de graduados. Depois, o facto de o diploma do secundário (ou do pós-secundário, CET, Curso de Especialização Tecnológica) já não oferecer a desejada garantia. Independentemente da leitura que queiramos fazer e da dificuldade resultante da falta de dados mais desagregados por tipo de educação-formação, um facto é iniludível: Temos um desajuste entre a oferta e a procura de competências.
Portugal atrasou-se imenso na criação de um ensino secundário profissionalizante e ainda hoje há deficiências notórias. A participação é baixa e a qualidade talvez se ressinta de não haver padrões nacionais de avaliação e comparação. A criação do ensino pós-secundário (CET) foi muito lenta e criou alguma ambiguidade quanto ao objetivo final de entrada no mercado de trabalho ou de passagem a licenciatura. Finalmente, só em 2014 foi criado o ciclo curto de ensino superior, TeSP, Técnico Superior Profissional, que está a crescer a muito bom ritmo, mas se ressente de um grande atraso histórico. (Note-se que em Espanha, 35% dos primeiros diplomas de ensino superior são de ciclo curto, contra 40% de licenciatura e 25% de mestrado, segundo o Education at a Glance, 2016.)
Todos os peritos apontam a necessidade de o sistema educativo se aproximar da realidade da vida profissional a todos os níveis. Com o ensino obrigatório até aos 18 anos, isto significa uma nova atenção ao perfil de formação profissionalizante da metade dos jovens que não aspira a entrar imediatamente no ensino superior. Este é um enorme desafio para o nosso sistema de ensino básico e secundário que há pouco mais de 10 anos se focava quase exclusivamente num ensino de cariz académico dirigido para o acesso ao ensino superior.
Mas, o desafio no ensino superior não é menor. Os diplomados deixaram já de estar destinados à administração pública e a alguns corpos profissionais autónomos (médicos, engenheiros, etc). Com a massificação do acesso que já se aproxima dos 50% da coorte, as instituições de ensino superior têm de assumir que o futuro dos jovens que recebem nos seus auditórios e laboratórios será, maioritariamente, no setor privado exercendo todo o tipo de atividade. Raramente, farão uso direto do perfil de formação que seguiram na universidade ou no instituto politécnico. Esta realidade é inelutável e exige da parte das instituições um repensar dos planos de estudos e da experiência educativa proporcionada aos jovens.
Os setores da nossa economia em crescimento mais rápido são o turismo e os serviços informáticos, mas todos reconhecemos que não podemos deixar de insistir em estratégias de crescimento de produção e exportação de bens (ou, numa linguagem mais moderna, de um misto de serviço-produto). A identificação destas áreas mais dinâmicas implica uma resposta atempada do sistema educativo onde a educação científica tem um papel muito importante. Uma sociedade democrática próspera exige que toda a população esteja preparada para ter um papel ativo na economia e na sociedade; deve ainda ter a capacidade de compreender as grandes opções e a forma de assumir as decisões que melhor acautelem o seu futuro. Só uma educação com uma forte componente científica permite atingir estes objetivos. A Casa das Ciências propõe-se reforçar esta cultura que leve a uma melhor compreensão do ambiente que nos rodeia e a uma capacidade de tomar decisões mais informadas.
Referência Gomes, JANF (2017) Editorial, Rev. Ciência Elem., V5(02):015
DOI doi.org/10.24927/rce2017.015 



A Revista de Ciência Elementar ISSN 2183-1270 (versão online) está disponível com acesso aberto.
A versão impressa ISSN 2183-9697 é enviada gratuitamente aos colaboradores regulares da Casa das Ciências e pode ser recebida pelo correio mediante o pagamento das despesas de preparação e envio, €10 para os quatro números do ano de 2017.

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